Toda ideia de raça e todas as etnias representam constructos históricos e políticos. Identidades também são invenções na forma de comunidades imaginárias. A existência de uma etnia é um processo social, econômico, cultural, político e intelectual. As bases iniciais da formação da etnia brasileira encontram-se nos séculos 16 e 17. O encontro dos navegantes portugueses com os índios do litoral forjou uma nova camada étnica. As genealogias clássicas brasileiras demonstram a centralidade e a importância de um João Ramalho, um Caramuru, um Jerônimo de Albuquerque e muitos outros. A estátua de Arariboia guarda a entrada de Niterói, aliado supremo na conquista da Baía da Guanabara. No século 17 já eram protobrasileiros os senhores da formação do Brasil. Os bandeirantes representavam a rica miscigenação entre europeus, indígenas e africanos. Os bandeirantes dilataram as fronteiras do Brasil na luta contra o império espanhol. Os bandeirantes já eram um produto essencialmente brasileiro, síntese de múltiplas miscigenações. O teste decisivo na criação do Brasil foram as Guerras Holandesas. O exército que derrotou os holandeses foi um exército bem brasileiro, bem misturado e miscigenado. No livro Castrioto Lusitano está imortalizada a frase: “Os governadores de índios e negros, D. Antônio Felipe Camarão e Henrique Dias fizeram conhecer ao mundo que o valor não é herança senão excelência”. O Exército Brasileiro tem as suas raízes nas Batalhas de Guararapes, na luta pela integridade territorial do Brasil. O processo de formação da etnia brasileira, iniciado no período colonial, continua em evolução, crescendo e se fortalecendo ao longo dos séculos. Foram os nascidos no Brasil os que mais contribuíram para a conquista e a colonização da Amazônia, do Guaporé, de Mato Grosso, do Brasil Central, das disputadas fronteiras do Sul do Brasil. Um esforço gigantesco canalizado para a formação de um dos maiores países do mundo, em todas as dimensões. Com a Independência, o Brasil adota o jus soli, um generoso processo de recepção e absorção de novos migrantes e seus filhos à sociedade nacional já iniciada, com um Estado nacional, língua nacional, cultura e valores próprios. A etnia brasileira, síntese do povo brasileiro desde os séculos coloniais, lutou contra ameaças e inimigos variados da ordem e inimigos da grei brasileira miscigenada. Hoje relacionamos o tamanho do Brasil a todos os que o defenderam e contribuíram, com seus esforços e sacrifícios, para que o Brasil tenha as fronteiras que nós temos hoje. No século 20 a etnia brasileira soube se defender das ameaças e agressões do nazifascismo. Na conjuntura da Segunda Guerra Mundial foi bem conduzida uma campanha de nacionalização para integrar plenamente as comunidades migrantes ao conjunto nacional. O objetivo do desenvolvimento nacional, com avanços em todos indicadores da qualidade de vida, é uma tarefa para todos os brasileiros. Não é possível dividir os brasileiros, um povo essencialmente miscigenado e misturado, entre diferentes origens ameríndias, europeias, africanas e asiáticas. Nenhuma política racialista promotora de pequenos apartheids, em termos de políticas públicas, consegue resultados ao longo do tempo. Políticas racialistas só podem reforçar ideias racialistas ou racistas, privilégios inconstitucionais. A etnia brasileira é uma síntese universal da história brasileira e o racismo só pode ser desconstruído e combatido com o resgate da cidadania e políticas universais de combate à pobreza. A nossa miscigenação, histórica ou consensual ao longo de mais de 500 anos, foi um dos fatores centrais para a existência do Brasil. Um país que deve ser cada vez maior e mais justo para todos, sempre com o esforço e a dedicação de todos.
Ricardo Costa de Oliveira, sociólogo, é professor da UFPR.
De Gazeta do Povo.
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Prof. Ricardo de Oliveira,
Nos correspondemos há alguns anos sobre João Carneiro de Campos. Na época, estava escrevendo o livro sobre a história da Mongeral Aegon, empresa de seguros e previdência com 176 anos de existência. Como faço para remeter um exemplar para o senhor.
Oswaldo Miranda
Gostei muito deste artigo do Prof. Ricardo de Oliveira.